O presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), Andrew Parsons, conversou com a Atletas pelo Brasil e falou sobre a importância de uma gestão profissional, transparente e com planejamento nas entidades esportivas do País e o “segredo” dos bons resultados das modalidades paralímpicas. O dirigente também contou sobre a preparação do Comitê para os Jogos do Rio 2016, deu exemplos de boas práticas de organizações esportivas brasileiras e finalizou afirmando que os Jogos no Brasil não ficarão devendo em nada para as outras edições da competição.
Andrew George William Parsons, de 37 anos, é natural do Rio de Janeiro e formado em Jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (RJ). Desde 2009, é o presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro e, no último ano, foi reeleito por aclamação até 2017. Sua trajetória em entidades e comitês esportivos vem desde 2001, quando foi secretário-geral do Comitê Paralímpico Brasileiro (2001-2008). Atualmente, Andrew também ocupa o cargo de vice-presidente do Comitê Paralímpico Internacional (2013-2017) e é membro da Comissão de Coordenação do Comitê Olímpico Internacional para os Jogos Tóquio 2020. Antes de se tornar o comandante do CPB, foi presidente do Comitê Paralímpico das Américas (2005-2009).
– Como está o processo do Comitê Paralímpico Brasileiro em relação às novas diretrizes impostas pela MP 620, que alterou a Lei Pelé?
Não tivemos que nos adaptar. Sempre me preocupei em ter uma gestão transparente e participativa. Daí a participação do Conselho de Atletas nas eleições do CPB e o limite de dois mandatos por presidente, instituídos em 2010, no segundo ano de minha gestão. Todas as nossas contas são publicadas com frequência regular no site do CPB e podem ser consultadas a qualquer momento, inclusive os salários dos funcionários. São medidas que só fazem aumentar a confiança de todos os níveis de governo (municipal, estadual e federal) e dos patrocinadores na obtenção de recursos para desenvolvimento dos nossos atletas.
– O CPB é visto como referência para as entidades esportivas brasileiras, principalmente com relação à gestão. Você considera que ele é um modelo de inovação para as outras confederações? Por quê?
O CPB tem sua maneira de trabalhar, de acordo com as especificidades do esporte paralímpico. Não posso falar pelas demais entidades, mas o modelo que implementamos no Comitê tem funcionado muito bem e os resultados comprovam que dá certo ter uma gestão moderna, participativa e transparente.
– O que é necessário para ter mais profissionalismo nas entidades esportivas?
É necessário vontade e competência. Vontade de colocar em prática uma gestão profissional com foco na prestação de serviços para atletas, clubes e confederações. Uma gestão em que o processo político não seja mais importante do que o processo técnico-administrativo. E competência para planejar a curto, médio e longo prazo e buscar as condições para executar este planejamento.
– Você tem mais algum exemplo de alguma outra entidade esportiva que possa ser considerada referência de boa prática? Quais?
Existem diversos bons exemplos em muitas entidades esportivas. Citaria diversas paralímpicas, como a Confederação Brasileira de Desportos para Deficientes Visuais (CBDV), que administra o Futebol de 5, Judô e Goalball; e a Associação Nacional de Desportos para Deficientes, que é a confederação responsável por Bocha e Futebol de 7. Fora do movimento paralímpico, citaria a Confederação Brasileira de Judô, a Confederação Brasileira de Rugby e a Confederação Brasileira de Desportos na Neve.
– A que se deve a evolução de resultados nas modalidades paralímpicas (Em Olimpíadas: 24º (2000), 14º (2004), 9º (2008) e 7º (2012))? E por que isso também não acontece com outras modalidades?
Penso que os bons resultados são consequência do trabalho em parceria do CPB com as confederações brasileiras paralímpicas, norteado por um planejamento inteligente e gestão eficiente, além do excelente material humano, atletas e técnicos, que temos em nosso País. Não posso falar sobre as outras modalidades, pois não conheço a fundo suas realidades e desafios.
– Quais são os objetivos para 2016? O CPB está fazendo alguma preparação especial?
A meta do CPB é alcançar o quinto lugar geral nos Jogos, melhorando em duas posições a colocação obtida em Londres 2012, quando a delegação brasileira ficou com o sétimo lugar, com 21 ouros, 14 pratas e oito bronzes. O CPB trabalha com uma série de programas e projetos entrelaçados que proporcionam o que chamamos de “Caminho do Atleta”, que vai desde o recrutamento e identificação do talento até o mais alto rendimento. Na ponta de cima, temos intensificado a preparação nas 22 modalidades do programa dos Jogos Paralímpicos, dando especial atenção aos principais atletas de cada uma delas, proporcionando-lhes uma preparação sob medida, por meio dos projetos de alto rendimento. Neste sentido, o foco é a conquista de medalhas de ouro, que são determinantes para atingirmos o 5º lugar no quadro de medalhas.
Além disso, estamos formando novos atletas com olhar [voltado] para Rio 2016, mas também para Tóquio 2020 e além. Há uma geração de atletas pós-2012 que já conquistou medalhas em campeonatos mundiais neste ciclo e que está pronta para se juntar aos protagonistas de Londres para que possamos fazer nossa melhor participação em todos os tempos. Uma iniciativa fundamental para o futuro é a construção, em São Paulo, à margem da Rodovia dos Imigrantes, do primeiro Centro de Treinamento Paralímpico do Brasil, com capacidade de atender atletas de 14 modalidades. É uma obra em conjunto entre Governo do Estado de São Paulo e o Ministério do Esporte, com a supervisão técnica do CPB. A previsão é que seja entregue em 2015 e possamos fazer lá a preparação para Rio 2016.
– Como você vê a preparação, principalmente na questão de infraestrutura, do Brasil para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos em 2016?
Tenho certeza absoluta de que não entregaremos nada inferior às edições anteriores em termos de estrutura. Acompanho de perto a preparação para os Jogos Rio 2016, já que no âmbito do Comitê Organizador assumi recentemente a coordenação do Comitê de Integração Paralímpica. Existem desafios que não são resolvidos com os Jogos, pois devem fazer parte de uma política de estado. Por exemplo, tornar o Rio de Janeiro uma cidade 100% acessível não será possível, como não aconteceu em nenhuma outra sede dos Jogos até aqui. Neste sentido, os Jogos têm que ser um catalisador, um agente de mudança, mas não um ponto final. Vejo um esforço e uma dedicação enormes de todas as áreas do Comitê Organizador Rio 2016 e dos três níveis de governo para realizar jogos de excelência técnica e que provoquem transformação.
– Conhece a Atletas pelo Brasil? O que acha do trabalho da instituição?
Conheço, sim. Acho fundamental que atletas de renome possam, de forma organizada, trabalhar para o desenvolvimento do esporte em nosso País e provocar o debate e as mudanças como a Atletas pelo Brasil tem feito.
– Incentivar as pessoas a praticarem mais esportes é um dos objetivos da Atletas pelo Brasil. O CPB também tem essa meta? Realiza alguma ação para que as pessoas, mesmo que não tenham potencial para serem atletas de elite, se movimentem e tenham uma vida mais ativa? Se sim, quais?
Dentro do conceito do caminho do atleta, existem ações de fomento do esporte para pessoas com deficiência sem foco específico no alto rendimento. Uma das ações do CPB que destacaria neste sentido é a parceria com governos municipais e estaduais para capacitação dos professores de educação física dos ensinos fundamental e médio da rede pública. É fundamental que uma criança com deficiência tenha as mesmas possibilidades de praticar atividades físicas na escola que qualquer criança sem deficiência. O maior desafio para isso está na formação dos profissionais de educação física que, muitas vezes, não receberam informações suficientes sobre como trabalhar com crianças com deficiência, principalmente de maneira integrada as outras crianças. Já realizamos muitos cursos de capacitação e esse é um programa que buscamos continuamente incrementar, buscando novos parceiros e maneiras de atingir o maior número possível de profissionais de educação física. Uma de nossas estratégias é alinhar essa iniciativa com as Paralimpíadas Escolares.
– O que acha que falta para o esporte ser considerado fundamental na política pública brasileira?
Acho que já temos algumas diretrizes em âmbito federal e em alguns estados, como São Paulo, por exemplo, que evidenciam que o esporte tem se tornado mais importante na agenda política nacional. Claro que ainda há muito o que avançar nesse sentido. Penso que tornar o Brasil um País em que o esporte se torne efetivamente uma ferramenta de educação, saúde e cidadania será o grande legado dos Jogos Rio 2016. O CPB está permanentemente à disposição do poder público para apoiar nesse processo.